Um dos temas mais presentes por aqui é o porque meu filho não come. Esse é um assunto recorrente porque não é um problema exclusivo das crianças, apesar de a criança com dificuldade alimentar apresentar alguns perfis, que já publicamos numa série publicada aqui no blog. Descobri na palestra do dr. Mauro Fisberg, pediatra e um dos principais especialistas em nutrição infantil no Brasil, no 4º Encontro Internacional sobre Dificuldades Alimentares, que existem perfis de famílias de crianças com dificuldades alimentares. “Várias razões podem transformar a criança em um picky eater, seletivo etc entre elas está a postura da família”, explicou o o médico Benny Kerzner, professor e pediatra americano e pioneiro no estudo de distúrbios alimentares infantis.
Entre os perfis familiares da criança com problema alimentar, os médicos apresentaram quatro tipos:
– Famílias normais: são as que respondem à demanda da criança, entendendo se ela é seletiva, se tem pouco apetite porque é muito ativo, e têm paciência para treinar o paladar e apetite dela.
– Famílias permissivas ou indulgentes: são aquelas que não têm controle sobre a criança e na primeira dificuldade acabam cedendo à vontade do pequeno e acabam se tornando reféns dele.
– Famílias controladoras: são aquelas rígidas e que não permitem que a criança se manifeste ou se impõem totalmente à vontade da criança.
– Famílias negligentes ou abandonadoras: são famílias que não se importam com o filho e podem levar a criança a ter uma quadro de depressão e ansiedade e o resultado é um filho apático diante do prato de comida.
Afora o último perfil, os outros três não são tão fáceis de serem identificados. Eu, por exemplo, achava que fazia parte da categoria normal (claro!).
Mas ao assistir um video exibido pelo Dr. Bill MacLean durante o congresso, descobri que sou controladora (quanta surpresa).
No vídeo, um garoto de pouco mais de um ano está sentado no cadeirão e chorando muito enquanto a mãe tenta alimentá-lo. Ele chora, vira o rosto se recusando a receber a colher de comida que a mãe oferece. Na segunda recusa do menino, a mãe enfia a colher dentro da boca da criança, o que a irrita ainda mais e eleva a potência do choro, com a boca aberta e a comida parada entre a língua e os dentinhos. A mãe não estava irritada. Conversava com o filho com voz carinhosa, tentando acalmá-lo. Eu me vi nessa cena. Foi quando Dr. MacLean explicou que ao enfiar a colher na boca insistindo para que a criança comesse, a mãe estava sendo controladora. Sim, isso mesmo. Foi quando eu perguntei se a criança, chorando daquele jeito, não estava fazendo manha.
Dr. MacLean riu e disse que ele tinha tendência a dizer que sim, mas, naquele caso, o garoto não estava fazendo manha. “Observem que ele está realmente lutando contra a colher. Ele é uma criança ativa, que não quer parar de brincar para comer, não quer ficar no cadeirão, mas a mãe não lhe dá nenhuma opção”, disse o médico, que mostrou a cena seguinte: ele pediu à mãe para que colocasse a colher, com comida, alguns milímetros abaixo do lábio inferior da criança, que naquele momento chorava muito, virava a cabeça para um lado e para o outro tentando impedir que a colher fosse para a boca. Mas, para a surpresa dele, a colher não se movimentou. Ficou parada. Ele foi diminuindo o choro e olhando para a colher. Em poucos segundos, ele parou de lutar contra a colher. Sorriu. Pegou a colher da mão da mãe e do jeito dele colocou na boca.
Ver aquela cena foi revelador para mim. Eu sou uma mãe controladora, mas estou no nível 3, acho, da controladoria porque não desejo há muito tempo que os meninos esvaziem o prato nem enfio a colher na boca deles. Dou a eles a opção de colocar a quantidade desejada de comida no prato (famílias controladora, em geral, colocam duas vezes mais comida no prato do que a criança pode comer, disseram os médicos) e desde muito pequenos, os meninos têm os próprios talheres, garfo e faca, inclusive. Dar à criança o poder de escolher a quantidade de comida e, do que lhe é oferecido, o que colocar no prato é dar autonomia e educação alimentar às crianças, ensinam os médicos.
A parte mais angustiante dessa história toda é o que já escrevi no post da semana passada sobre ossofrimento das mães de crianças com dificuldades alimentares: são raros os pediatras ou outros profissionais da saúde habilitados para fazer o perfil do tipo de criança e de família com dificuldades alimentares e indicar as orientações mais apropriadas para que a paz reine à mesa na casa dessas pessoas.
Mas, como somos brasileiros e não desistimos nunca, nós, mães, seres poderosos, vamos tentando. Uma hora errando. Em outra acertando.
Da aula que presenciei com os especialistas ficou o aprendizado máximo: tenha tempo, paciência e olhos de lince para observar seu filho e também você!
FONTE: Comer para Crescer