Até certo ponto, o medo é normal

Até certo ponto, o medo é normal

O sentimento faz parte do desenvolvimento infantil, mas temores aparentemente inofensivos podem se transformar em fobias quando existe excesso. Pais e escola devem estar sempre atentos aos sinais das crianças

Na escola, uma única “nota vermelha” apareceu no boletim de Sarah, 4 anos. Na atividade feita na horta da escola, seu conceito foi de baixo aproveitamento. O problema não estava no cuidado inadequado com as plantinhas. Sarah não teve um bom desempenho porque o medo de minhocas a impediu de chegar perto da plantação.

Nenhuma professora obrigou a menina a se aventurar na terra, mas a questão foi levada à mãe, Ângela de Castro Deus Freire. A escola, assim como os pais, tem um papel muito importante na superação dos medos que as crianças podem apresentar.

Segundo a psicanalista Rosa Marini Mariotto, professora de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e doutora em Psicologia Escolar pela Universidade de São Paulo (USP), os medos como o de Sarah são característicos de um processo de desenvolvimento infantil. “Nesse momento em que a criança se vê sozinha com o medo, e tem de se virar sem a família, ela deve ter recursos psíquicos para poder dar conta da experiência”, diz. Ela afirma que na idade da menina, que também não entra em lugares escuros e tem pavor de morcego, é comum as crianças conviverem com algum medo. “O importante é poder conversar, sem pressionar. Essa atitude de forçá-la a combater o medo a qualquer custo é prejudicial.”

A união entre família e equipe pedagógica são importantes para evitar medos desnecessários. O mesmo direcionamento deve ser seguido em casa e na escola, como lembra a psicopedagoga Marcia Abicalaf, coordenadora pedagógica da Educação Infantil do Colégio Dom Bosco Batel. Ela usa o exemplo dos personagens fantasiosos. “A criança tem contato com contos de fadas e precisam saber que aquilo não é verdadeiro. A escola mostra que existe um mundo fantasioso, com bruxas e monstros, e o mundo real. Os pais têm de fazer o mesmo. Caso contrário o medo pode ser instalado na criança e dar trabalho mais tarde”, diz. Por outro lado, Marcia lembra que alguns tipos de temor são sadios, e importantes para o desenvolvimento. “Medo é importante quando se refere à ação, como não subir na cadeira para não se machucar. Assim ela tem noção da limitação do que pode fazer.”

Exemplo

A forma como as pessoas ao redor da criança se comportam determina a maneira como ela vai encarar as situações. De acordo com a psicóloga Maria Angela Monteiro Raio, psicoterapeuta sistêmica de família e de casais, os pais devem se mostrar presentes, mantendo o controle e garantindo o cuidado. “A maneira como o pai conversa sobre o medo é que vai fazer a diferença na forma como a criança enfrenta o problema. Às vezes, o medo é do adulto. Crianças repetem o medo dos pais ou cuidadores quando percebem a reação dos mesmos a algumas situações.”

Para a psicóloga Cleia Oliveira Cunha, a atitude dos cuidadores depois que o medo se apresenta também influencia o comportamento das crianças. “Não se pode ironizar ou desqualificar o temor. A desaprovação só vai trazer constrangimento e humilhação. Se a criança for forçada a levar a situação, isso só vai criar ansiedade e piorar medos transitórios que poderiam desaparecer facilmente se os adultos respeitassem e a ajudassem a criança a superá-los”, afirma.

Quando o medo paralisa a criança a impedindo de brincar e de desenvolver as atividades próprias para a sua idade é preciso ajuda profissional. O medo excessivo deve ser investigado também quando a criança já passou dos 7 ou 8 anos, como explica Rosa Mariotto. “Quando os temores persistem e atrapalham o desenvolvimento da criança, que deixa de sair de casa, não tem convívio social legal, não vai em festa com medo de encontrar palhaço, é preciso investigar.”

FONTE: Gazeta do Povo

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